CIDADE

O cheque do Pedro

Artigo escrito por Dionísio Ladeira


Publicado em: 16/12/2021 às 15:44hs

...

O cheque mais badalado de Viçosa circulou pelos anos 70, no início do ‘boom’ do comércio local. Em filas sucessivas, em dias sucessivos, em empreitadas – como diria o Antônio Rogério Magri, Ministro do Trabalho do Governo Collor – ‘insucessivas’, estava o caixa sempre avisando ao infeliz portador:

• Não tem fundo, não.

• Tem fundo não.

• Fundo não.

• Não.

• Pô!

O banco não aceitava o cheque, o comércio não aceitava o cheque, ninguém aceitava o cheque. E o cheque ali. Preenchido direitinho. Datado direitinho. Assinado direitinho.

Recusado pelo banco, pelo comércio, pelo povo – por Deus! –, o cheque mais famoso dos anos 70 é oferecido em pagamento de uma despesa – veja só – ao próprio ‘emitente’. É bom repetir para ficar bem claro: o cheque é oferecido em pagamento de uma despesa à própria pessoa que o ‘emitiu’, à própria pessoa que o ‘assinou’.

E o Pedro Vampa, absolutamente convicto:

- Não! Esse eu conheço!

* * *

Mas a história ainda não terminou. O cara foi a Belo Horizonte e estava todo tranquilão ali na Praça Sete quando chega a polícia:

- Documento!

- Ih! ‘Seu’ guarda, deixei os documentos em Viçosa...

- Então entra no camburão!

- ‘Seu’ guarda, compreende: lá em Viçosa a gente anda sem documentos, todo mundo conhece todo mundo...

- Sem documento, o Senhor vai se explicar ao Delegado!

Aí o cara lembrou-se do cheque. Lá não estava a sua fotografia. Não estava o seu nome.

A própria assinatura não era a sua (era a do Pedro). Mas estava pelo menos escrito o nome da cidade: Viçosa!

Mostrou ao guarda o papel já recusado pelo banco, pelo comércio, pelo povo – por Deus!

–, até pelo emitente. Mas que poderia salvá-lo daquela iminência de um passeio de camburão...

De ter de conversar com o Delegado...

O guarda examinou rapidamente o papel já meio ensebado e voltou ao ataque:

- Isso não vale!

E o infeliz não teve como fugir do “Teje preso!” tão em voga naqueles anos 70...

Mas, impressionado com a convicção do guarda ao dizer “Isso não vale!”, ainda teve tempo de lamentar-se:

- Puxa! Até aqui em Belo Horizonte eles conhecem este cheque...