Segunda metade dos anos 40. É na Silviano Brandão que está tudo: a Igreja Matriz, a Prefeitura, o Fórum, o Cinema, o Viçosa Clube, o Colégio de Viçosa, as oficinas da ‘Cidade de Viçosa’ - agora com a preposição sem o artigo -, a casa do Dr. Arthur Bernardes, o jardim. É na praça que, a qualquer hora, se formam as rodinhas pra jogar conversa fora... É no jardim que, no horário aprazado, desfilam moças e rapazes - elas no sentido horário; eles no sentido anti-horário... É por ali que, no tempo propício, acontecem os sermões dos padres e dos cônegos, os dobrados da Lira Santa Rita, o leilão pros santos, a queima do Judas, o comício político, o desfile do Carnaval, a apoteose da Marcha Nico Lopes.

É na praça que está uma das figurinhas mais fáceis de todos os dias e de todas as horas: o Zé Miluca, filho do Miluca, este um dos poucos choferes de táxi, da época. E é o Zé que a turma vive gozando, exatamente porque é meio abobalhado e gosta de andar impecável, sobretudo com os sapatos sempre muito bem engraxados.

E eis que aparece em Viçosa um camelô que também percebe a simplicidade do Zé e acha que ele pode perfeitamente se prestar ao papel:

- Tome este ovo. Depois do almoço vou começar minha exibição aqui na praça e vou dizer pro pessoal que você vai botar um ovo.

E dá as instruções:

- Abra os fundilhos da calça, coloque o ovo lá e na hora em que eu chegar por trás de você, abaixar-me e falar “Este cavalheiro aqui vai botar um ovo”, você solta o ovo. Ok?

Zé faz o sinal de que está ok, pega o ovo e vai pra casa almoçar.

Após o almoço, rodinha feita na praça, o camelô começa com aquele papo e aparece o Zé Miluca com aquela cara que só ele tinha.

Entusiasma-se o camelô:

- Senhoras e Senhores. Este cavalheiro aqui vai botar um ovo!

E põe o Zé na roda, posta-se por trás dele, abaixa-se... Nada!

O camelô finge que está tudo bem, encosta a mão no fundilho do Zé e insiste para a já grande roda de curiosos:

- Este cavalheiro vai botar um ovo... Nada!

O camelô reforça o anúncio agora para uma quase multidão, faz cara feia pro Zé e repete sem deixar transparecer uma pitada de inquietação:

- Senhoras e Senhores. Este cavalheiro vai botar um ovo! Nada!

E o camelô fugindo ao ‘script’:

- Zé, cadê o ovo?!

E o Zé Miluca com aquela boca torta, amparada pela mão em forma de concha, lança a frase que Viçosa lembra até hoje:

- ‘Murcei’ ele...