JUSTIÇA

Justiça determina bloqueio de bens de empresário supervacinado em Viçosa

A indenização por danos morais coletivos, de R$ 150 mil, poderá ser destinada a instituição de combate à pandemia da Covid-19


Publicado em: 27/08/2021 às 09:30hs

Justiça determina bloqueio de bens de empresário supervacinado em Viçosa

O empresário viçosense José Lúcio dos Santos, 69 anos, denunciado após ter tomado doses extras de vacinas da Covid-19, em Viçosa e no Rio de Janeiro, teve parte de seus bens bloqueados pela Justiça em Ação Civil Pública (ACP) movida pelo Município de Viçosa, cuja Procuradoria Geral reverteu decisão inicialmente desfavorável em primeira instância.

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) determinou, no último dia 11, o bloqueio imediato de valores ou indisponibilização de bens e ativos em nome do réu até o montante necessário para assegurar o pagamento da indenização por danos morais coletivos pleiteada pelo Município de Viçosa, no valor de R$ 150 mil. O agravo de instrumento em segunda instância foi acolhido após a Procuradoria Geral do Município ter seu pedido de tutela de urgência negado pela justiça de Viçosa.

Em sua decisão, a juíza Daniele Viana Lopes, da 2ª Vara Cível da Comarca de Viçosa, salientou que a alegação, por parte do Município, de que o réu poderia tentar frustrar a execução do processo, “não configura perigo de dano, de forma a autorizar o deferimento da liminar”. A magistrada reforça que não ignora a existência de indícios de que “o réu aproveitou-se do atual contexto e das dificuldades de coordenação entre os estados para, de má-fé, vacinar-se em doses e vacinas superiores ao recomendado pelo Poder Público”. Mas, para ela, eventual deferimento da liminar, nos termos pedidos, não é apto a neutralizar o prejuízo causado pelo ato e nem impedir efetivamente que outras pessoas tentem fazer o mesmo.

No embasamento do pedido de medida cautelar, a Procuradoria Geral do Município de Viçosa alegou que o processo possui tripla finalidade: a pedagógica em relação ao réu, buscando evitar reincidência sua ou de seus familiares; a inibitória em face da coletividade, desestimulando novas condutas; e, ainda, a de assegurar futura e possível indenização pelo dano moral coletivo alegado, em quantia que poderá ser destinada aos hospitais ou a qualquer outra instituição ou fundo, a critério da Justiça, cujo objetivo seja o financiamento de ações voltadas ao combate à Covid-19.

A decisão da Justiça local se difere da proferida pelo desembargador Vitor Inácio Peixoto Parreiras Henriques, da 7ª Câmara Cível do TJMG. O relator destaca, em sua decisão, que “a indenização futura não será capaz de reparar, de forma efetiva e pontual, o prejuízo de cada dose extra desnecessariamente aplicada, não se podendo permitir que mais situações como a retratada nos autos aconteçam até o julgamento final do processo”.

Ele alega que “está evidenciada a presença de fortes indícios de ato atentatório aos princípios constitucionais e à coletividade [...]” e que “não se trata apenas de aproveitamento pessoal, mais do que isso, vislumbra-se efetivo prejuízo a outros cidadãos e inaceitável desperdício de insumo, dada a ausência de comprovação científica contundente acerca da eficácia de imunização extra de fabricantes diversos, principalmente em um curto espaço de tempo”.

Ainda de acordo com o desembargador do TJMG, ao contrário dosustentado na decisão recorrida, a gravidade da conduta praticada pelo réu “não só reforça a probabilidade do direito alegado pelo autor, que pretende o reconhecimento de um dano moral coletivo passível de indenização; mas, também, pode estimular ou incentivar que outros façam o mesmo”.

O magistrado lembrou, em sua decisão, que a questão tem sido tratada de forma contundente pelo Poder Público nos mais diversos entes da federação que receberam denúncias de imunização extra e burla ao Plano Nacional de Vacinação, levando o Ministério Público do Estado de Minas Gerais a divulgar Nota Técnica sobre investigação e responsabilização criminal, por estelionato, daqueles que estão se “revacinando”.

ENTENDA O CASO 

A Procuradoria Geral do Município de Viçosa ajuizou a Ação Civil Pública (ACP), distribuída no dia 9 de julho, contra o professor aposentado e empresário do ramo de imunizantes veterinários, José Lúcio dos Santos, após revacinação constatada pelo setor de Atenção Primária em Imunização da Secretaria de Saúde. A descoberta ocorreu após o empresário abordar a equipe de imunização, no dia 25 de junho, alegando ter perdido sua data correta de vacinação.

Segundo relato da PMV, após a aplicação do imunizante e conferência de dados, foi constatado que o mesmo havia tomado duas doses da Coronavac em Viçosa, uma da Astrazeneca no Rio de Janeiro e a última da Pfizer, também em Viçosa. A quarta dose foi aplicada no dia 25 de junho, mas a coordenação da campanha só constatou o fato no dia 6 de julho. Segundo a Prefeitura de Viçosa, imediatamenteapós a constatação do fato pela equipe da campanha de vacinação, a Procuradoria Geral foi acionada para a tomada de medidas de cunho cível e administrativo, e também o Ministério Público, para fins criminais.

O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) instaurou um Procedimento Investigatório Criminal para apurar a denúncia, que tramita em sigilo desde o dia 7 de julho. O Folha da Mata solicitou acesso ao processo, mas a assessoria do órgão informou apenas que “a Promotoria de Justiça ainda está avaliando as providências a serem tomadas”.

A esposa do empresário também é suspeita de ter recebido doses extras dos imunizantes. O MPMG incluiu o nome de Maria da Conceição Costa dos Santos, de 73 anos, nas investigações. De acordo com o órgão, o sistema de vacinação mostra a aplicação da 1ª dose da Coronavac no dia 29 de março, a segunda no dia 14 de abril, e uma 3ª dose, dessa vez da Astrazeneca, no dia 17 de junho.

O Folha da Mata fez contato com a defesa de José Lúcio dos Santos, que preferiu não comentar a decisão, ressaltando apenas que considera “não haver fundamento legal para a determinação do bloqueio de bens e valores”. A defesa declarou ainda que recebeu a decisão com serenidade e informou que se manifestará apenas nos autos do processo.